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Belém diante da COP‑30: entre a vitrine da Amazônia e o risco de um vexame mundial

OPINIÃO | Por: Moisés Dutra

Belém, capital do Pará, foi escolhida para sediar a COP‑30 — a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas — entre 10 e 21 de novembro de 2025, evento que deve reunir até 50 000 pessoas por dia, incluindo dezenas de chefes de Estado. Mas a realidade da cidade coloca em dúvida a capacidade de comportar um encontro dessa magnitude: infraestrutura atrasada, rede hoteleira limitada, mobilidade precária, e um cenário urbano marcado por degradação social e ambiental.

Rede hoteleira: quantos leitos faltam?

Desde janeiro de 2025, Belém ampliou sua oferta de hospedagem de aproximadamente 18 000 para 36 000 leitos, com acréscimos vindos de novos hotéis, aluguel de temporada, uso de navios de cruzeiro e estruturas militares ou escolares adaptadas. Ainda assim, esse total é insuficiente para a demanda estimada de 50 000 pessoas — falta, portanto, um contingente de pelo menos 14 000 leitos.

Transporte aéreo: aeroporto em obras, mas sob pressão extrema

O Aeroporto Internacional de Belém (Val‑de‑Cans), o mais movimentado da Região Norte, tem capacidade para cerca de 2,7 milhões de passageiros por ano, mas deverá enfrentar um fluxo diário equivalente a quase quatro vezes o volume normal durante a COP‑30. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) antecipou a conclusão da Fase I‑B de modernização do terminal para 31 de agosto de 2025, com ampliação da área de embarque e do pátio de aeronaves. Um hotel com 148 quartos (144 leitos) será construído dentro do aeroporto como parte do esforço para atender a demanda.

Mobilidade urbana: BRT e transporte defasados

O sistema BRT Metropolitano de Belém, planejado para reorganizar a mobilidade entre a capital e os municípios vizinhos, ainda está em fase de implantação e enfrenta atrasos desde 2021. Obras importantes como a requalificação da BR‑316 e construção de corredores exclusivos estão paradas ou incompletas. A renovação parcial da frota de ônibus está ocorrendo, mas não será suficiente para atender ao transporte massivo esperado nos dias de evento.

Desafios urbanos e ambientais persistem

Belém convive com graves vulnerabilidades sociais: mais de 50% da população vive em favelas em áreas alagadiças com saneamento precário, apenas 17% têm coleta de esgoto, e o descarte irregular de lixo está presente em bacias que abastecem rios da cidade. A polêmica visual com grandes pilhas de lixo a céu aberto perto de pontos turísticos reforça a imagem de degradação urbana — um cartão postal inverso à proposta sustentável da COP.

Reflexão final: é tempo de ousar por transformação

A realização da COP‑30 em Belém é um desafio audacioso — e ao mesmo tempo, uma oportunidade transformadora. Para que isso não se transforme numa façanha que exacerba problemas existentes, o Pará e o Brasil precisam garantir:

Expansão acelerada da rede hoteleira e logística de hospedagem, incluindo hotéis, navios, aluguéis temporários e instalações alternativas. Entregas pontuais das obras aeroportuárias, assegurando o terminal pronto até o fim de agosto de 2025. Mobilidade urbana efetiva, com BRT, ônibus modernos e integração metropolitana operacional. Revitalização urbana e ambiental, saneamento em áreas vulneráveis, manejo do lixo e requalificação das zonas degradadas que entrarão no cenário internacional.

Se essas condições forem atendidas, Belém pode virar símbolo de “renovação amazônica” — não apenas cenário, mas mensagem poderosa sobre sustentabilidade. Caso contrário, corre-se o risco de um evento que expõe fragilidades em vez de inspirar mudanças globais.

Belém tem potencial, conhecimento local e visibilidade. Resta transformá-los em ação concreta — rápido, inteligente e transparente. A COP‑30 não é apenas uma conferência: é uma vitrine para mostrar se a Amazônia pode ser exemplo real de desenvolvimento sustentável.

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